Fazer
faculdade de serviço social nunca foi fácil, mas sempre foi um sonho. Sou
adotada, então não foi surpresa nenhuma para os meus pais e minha irmã. A
Milena ainda está no colégio e de longe quer se aventurar na vida de
universitária. Ela também veio do mesmo orfanato que eu estava e é nele que de
vez em quando visito as crianças e faço a alegria daquela casa com as Irmãs.
Elas me agradecem pelo trabalho voluntário, que pode até vir a ser meu estágio.
Algum dia.
Irmã Felícia
tanto pediu que até aceitei cuidar das crianças junto com ela, pois as outras
estariam junto ao bispo. O que eu traduzi como “gandaia”, mas acho que as
freiras merecem descanso, ir visitar as famílias que deixaram para trás quando
escolheram servir não só a Deus, mas às crianças também. Eu não hesitei em
dizer sim, e logo avisei em casa. Minha mãe e minha irmã nem se manifestaram,
mas meu pai disse que a ceia perderia um pouco o sentido sem a minha presença.
Fui adotada
com dez anos e nunca soube a minha história do nascimento, pois a minha
verdadeira começou com a adoção e depois com a presença de uma irmã. Minha mãe
sempre quis engravidar, mas meu pai é estéril e então a solução foi a adoção.
Não seriam só eles a deixar pra trás, pela primeira vez na noite de Natal.
Lucas, meu namorado há três anos nem quis ir comigo. Eu pensei que ele iria,
porque a gente sempre passa a noite juntos. Cada um na sua casa e depois ele
vem me buscar, fica um pouco lá em casa e nós vamos para a casa dele. O irmão
tem várias amigas, então acho que meu estudante de engenharia nem vai sentir a
minha falta.
“Carol, tudo
bem você pode ir ficar com as crianças, mas eu não vou, já te disse.” Ele
respondeu, assim que disquei seu número antes de pegar o carro e ir para o
Orfanato Irmã Teresa. “Amor, eu sei, mas o que custa? Só uma passadinha?”
Tentei pela milésima vez, convencê-lo. “Eu já te disse, se você prefere essas
criancinhas, pode ir. Eu tenho mais o que fazer.”
“Tudo bem.”
Eu respondi desanimada. “Tenha um ótimo Natal.” “Você também.” Foi o que recebi
em resposta.
Peguei minha
pequena malinha, e uma sacola cheia de presentes para as meninas e os meninos.
O orfanato só abriga crianças de sete aos quinze anos, então livros vão servir
como uma luva. Eu fico imaginando a cabeça de um adolescente que só tem outras
crianças como companhia. Os pais abandonaram e nem pensaram em como ele
cresceria, como seria bonito, inteligente. Em como encheria a casa de alegria.
Eu tive sorte de encontrar pais aos 10 anos, mas e eles?
Esse
pensamento se afasta quando escuto o toque de mensagens do meu celular. Dois
toques. A primeira mensagem é da Ana, minha melhor amiga que resolveu fazer
Música. “Carolzinha! Mais tarde te ligo. Pena que você não pode ver o musical
que organizei. Vai ficar lindo! Peço alguém pra filmar e te mostro depois. Boa
sorte com os pirralhos. Beijinhos da ANoel”
Meu coração
se entristece por não ver o musical de Natal que a Ana produziu junto com uns
colegas. Mas eu sei que ela vai brilhar. Abro a segunda mensagem. “Carolina,
tudo pronto para essa noite? Você poderia trazer massas de cupcake? Aprendi com
o Edu Guedes semana passada e queria fazer para os meus meninos e claro com sua
ajuda. Não demore, sim? Beijo. Irmã Felícia.” Cupcakes! Hummm. Claro que eu vou
levar, essa ideia vai ficar maravilhosa na barriga.
Junto minhas
coisas, pego umas massas de cupcake da Milena, ela nem vai perceber que eu
roubei, já que a essa hora, oito da noite, não vou achar nada aberto. Véspera
de Natal? Só doido com loja aberta. Nem doido eu acho. Meus pais me dão uma
caixa média de presente e pedem para eu abrir só meia-noite, na sacada do
prédio do orfanato. A Milena me dá um beijo de Feliz Natal e retribuo com
vários outros. Inclusive algumas cosquinhas. Essa sim é a família que vou
agradecer o menino Jesus por dá-la a mim.
O trajeto é
tranquilo, peguei o carro do papai e as crianças estão todas dormindo. Com
exceção de nenhuma. Irmã Felícia me conta que todo ano é assim, porque elas
ficam a madrugada toda acordadas. Me junto a ela na cozinha para preparar a
nossa sobremesa: Cupcakes! Vou adiantando a ceia e arrumo a mesa da forma mais
linda possível. Nunca imaginei uma mesa tão grande como essa! No total: vinte e
quatro lugares. Parece aquelas mesas de filmes medievais, castelos, reis e
rainhas. Se bem que essa noite um rei vai nascer, então está tudo conforme o
esquema.
O tempo
passa tão rápido que nem percebo. Onze e meia. “Meu Deus! Já é quase hora de
acordá-los!” Digo a Irmã que está sentada na mesinha da cozinha, descansando. “Não
se incomode, elas acordam umas às outras e correm pra mesa. Fazemos as orações
e elas vagam por aí até cansarem mais uma vez.”
“Tudo bem.
Exatamente à meia-noite?” Pergunto. “Não. Nós começamos a comer à meia-noite.”
Ela olha no relógio de pulso. “Em três... Dois... Um.” E escuto vários pés
correndo até a sala e escolhendo seus lugares. Eu e Irmã Felícia vamos nos
sentar cada uma numa ponta. Ela me chama para ver o espetáculo e fico
impressionada com a felicidade estampada em seus rostos e a educação de sempre.
Eu nunca tinha vindo aqui no Natal e desde os 16 ajudo sempre que posso. Dois
anos depois, cá estou eu. Passando o Natal longe da família e do ex...
Namorado?
“Oi, Carol.”
Júlia, uma loirinha de doze anos me cumprimenta. “Oi querida. Dormiu muito
eim?” Brinco um pouco com ela, que se senta do meu lado direito. “Nada. Só a
rotina natalina de sempre. Você trouxe presentes? Muitos aqui ainda acreditam
no Senhor Noel...” Ela sussurra. “Claro que sim. E trouxe uma coisa muito
especial pra você também!” Sussurro de volta e percebo que todos já se
sentaram. Tenho certeza que ela vai gostar de Alice no País das Maravilhas!
Irmã reza um Pai Nosso para acalmar a todos e eu acompanho.
“Dormiram
muito, eim meninos?” Ela faz cara de brava. “Hoje não tem presentes, vocês
podem comer e ir pra cama!” Muitos “Ahs” e caras tristes aparecem, mas logo se
desfazem. “Que isso meninos! Hoje tem pra todo mundo! Mas temos que agradecer o
nosso Deus por trazer o menino Jesus, por nossa comida e o presente que todos
vão ganhar!”
Irmã começa
rezando uma oração belíssima que não consigo identificar. Sou católica, mas não
tanto quanto minha mãe, por exemplo. Eu tendo Deus no coração, mais nada
importa para mim. Mas vejo que eu devia voltar a frequentar mais. Ela termina e
em uníssono os meninos rezam uma oração que não reconheço, porque eles a
fizeram e decoraram! Meu Deus! Nem na minha época de orfanato nós éramos tão
educados e organizados. Depois cada um faz sua oração. Pedindo e agradecendo.
Pedidos de uma família até um bom emprego no futuro. Chega a minha vez e
agradeço por compartilhar esse momento com eles, pelo ano de 2014 que já está
acabando, e peço a Deus que ilumine minha família e meu namorado que não estão
presentes comigo hoje. Peço pelas irmãs e por cada criança e adolescente que
ainda não encontraram seu lugar no mundo. Que elas não vivam a procura de uma
família e sim, de carinho e amor eternos que podem encontrar nas pessoas
certas. Nós rezamos mais um Pai Nosso e sentamos à mesa para a ceia, quando meu
celular toca. Penso que é a Ana, mas é só uma mensagem do... Lucas!
“Vá a
sacada. Papai Noel chegou com um presente especial pra você.”
Penso em
ignorar, mas ele nunca me mandaria uma mensagem assim, à toa. Peço a Irmã um
minuto e ela entende que devo querer dar Feliz Natal aos meus pais. De repente
me lembro do presente deles. A caixinha! À meia-noite! Vou até a sala, pego a
caixinha e vou pra sacada. Meu desespero é tanto que quase a deixo cair lá
embaixo. Mas consigo abrir e me surpreendo por seu uma... Lanterna? Que isso?
Meu relógio marca um minuto para meia-noite. Ligo a lanterna e escuto um jingle bells bem familiar. Vindo do
terraço. Aponto a lanterna pra cima e encontro...
“Lucas? O
que você está fazendo aqui?” Me assusto e pergunto.
“Meu amor,
nunca duvide do meu sentimento por você. E calma, não vou te pedir em
casamento. Temos só dezoito anos. Não fique assim.” Ele avisa, vendo a minha
cara de espanto. “Lembra do seu sonho? Não desista de nenhum sonho por mais que
seja impossível. Eu te amo.” Ele, que estava gritando, some e fico preocupada.
Mas percebo que está ventando um pouco. Tinha previsão de chuva pra hoje e
não... Previsão para neve?! Vejo a neve cair do céu, mas não de tão alto. De
uma máquina de onde Lucas está. Eu sempre quis que nevasse no Brasil, porque
podemos viajar e vê-la em outros lugares. Porém em outro lugar, não vai fazer
nenhum sentido, voltarmos pra casa e não encontrarmos esse climinha gostoso.
Eu já tinha
visto a neve numa viagem pro Chile que eu fiz com a escola, saiu totalmente de
graça pra mim, porque foi concurso e seria uma viagem de estudos. Fomos numa
época que só nevou um pouquinho e fiquei com gosto de quero mais.
Entro em pânico, só que um pânico gostoso e
grito todo mundo. Em questão de segundos, todos estão maravilhados com a mesma
visão que a minha. Em dez minutos tudo acaba, cada um me dá um abraço
agradecendo pelo presente e depois de tudo isso, Lucas aparece na porta. Eu
corro e dou o maior abraço nele, seguidos de vários beijos e vários “eu te amo”
também.
“Como você
conseguiu fazer isso?” Perguntei, ainda nos braços dele e todo mundo assistindo
a cena. “Bom, é que eu não tinha nada em mente como presente de Natal pra você
e lembrei do seu sonho. O resto é segredo. Carol, sério. Eu só estava sendo rude
pra você não perceber nada. Eu estava fazendo uma surpresa.” Agora eu penso
sério. Meu Deus! Obrigada por ter colocado esse homem na minha vida. “Eu não me
importo. Eu amei minha surpresa. Que acabou virando NOSSA SURPRESA. Ah, fique
sabendo que se fosse um pedido de casamento em pleno Natal eu teria aceito.” Ele
me deu vários outros beijos e chamei-o para comer. No caminho, o caçula da
casa, João, perguntou para o meu namorado:
“Você quem é
o Papai Noel?”
“Não. Sou um
amigo dele e do menininho Jesus.” Papai Noel? O Lucas nem tem barba... Abro um
sorriso de felicidade, maior do mundo. “E de nós todos, João.” Completei,
porque eu já dividia minha vida com ele. Agora, seria mais uma parte dela, eu
sabia que aquela noite estava longe de acabar por ser Natal e que ele não me
desapontaria. Nem Jesus, que acabara de nascer. Nem meu namorado.
Oi gente!!! Espero que tenham gostado. Muito obrigada por chegarem até aqui em baixo.
Feliz Natal para cada um que me acompanha e que de alguma forma chegou até o blog.
Beijinhos! Fiquem com a trilha sonora da Carol...
Olá Bella, tudo bom?
ResponderExcluirMenina que conto incrível. Continue escrevendo haha <3
Abraços, Mr. Souza.
http://smallscribble.blogspot.com/
Oi Bela, tudo bem?
ResponderExcluirQue a Magia do Natal contagie e todos!!! Lindo conto, parabéns. Um feliz ano novo! Que em 2015 você escreva ainda mais
beijos
Kel
www.porumaboaleitura.com.br